A inclusão de crianças com Autismo na Educação regular: Uma questão de direitos e deveres
O goleiro Cássio, uma figura esportiva de destaque no Brasil, recentemente expressou seu descontentamento nas redes sociais. O motivo de sua frustração? A dificuldade em matricular sua filha de sete anos, Maria Luiza, que é autista, em escolas de Belo Horizonte. A experiência de Cássio destaca uma questão importante que muitas vezes é ignorada: o direito de crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA) à educação inclusiva.
Mesmo as instituições que se anunciam como inclusivas apresentaram obstáculos, alegando que o profissional especializado que acompanha Maria Luiza desde os dois anos de idade não poderia estar presente na sala de aula. Mas, a questão que se coloca é: essa justificativa é válida? As escolas têm o direito de recusar a matrícula de uma criança com base nessa condição?
A resposta, de acordo com a legislação brasileira, é um retumbante ‘não’. A advogada Flávia Marçal, especialista em direitos das pessoas com deficiência e participante do grupo de trabalho do Parecer 50, um documento sobre educação para estudantes com autismo aprovado pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) e homologado pelo Ministério da Educação (MEC) em 2024, reitera que recusar a matrícula de alunos com deficiência em escolas de qualquer nível é uma prática ilegal e inconstitucional.
A legislação brasileira sobre educação inclusiva
A Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015), também conhecida como Estatuto da Pessoa com Deficiência, assegura o direito à educação inclusiva para todas as crianças com deficiência. De acordo com Flávia, recusar a matrícula de uma criança com deficiência é considerado um ato discriminatório, passível de penalidades, incluindo uma pena de reclusão de dois a cinco anos e multas.
Ainda no âmbito legal, a Lei Berenice Piana (Lei nº 12.764/2012) estabelece que as escolas são responsáveis por oferecer as condições necessárias para a participação e o aprendizado de crianças com autismo. Isso inclui garantir um acompanhante especializado. No entanto, a interpretação dessa responsabilidade ainda é tema de debate.
O papel do acompanhante especializado
Segundo a legislação brasileira, o acompanhante especializado é um direito do estudante com TEA em ‘casos de comprovada necessidade’, embora suas funções não sejam especificadas. A Lei Brasileira da Inclusão, por exemplo, menciona um ‘profissional de apoio’ que atua em todas as atividades escolares onde se fizer necessária, auxiliando em atividades de alimentação, higiene e locomoção do estudante com deficiência.
De acordo com Flávia Marçal, o acompanhante especializado é fundamental para a inclusão e o desenvolvimento de alunos com TEA. Ele é responsável por auxiliar o estudante em questões que vão além das atividades pedagógicas, incluindo a comunicação, a interação social, a higiene, a locomoção e os cuidados pessoais. A intensidade do apoio varia de acordo com o nível de autismo da criança, que pode ser classificado em 1, 2 ou 3.
Controvérsias sobre a inclusão de crianças com autismo na escola
Embora a presença do acompanhante especializado seja uma demanda de muitas famílias, algumas escolas argumentam que a presença desse profissional interfere na relação entre o aluno e o professor na sala de aula e, por isso, esse profissional não deve auxiliar em questões pedagógicas, limitando sua atuação a necessidades de locomoção e alimentação.
Essas controvérsias destacam a necessidade de orientações mais claras e regulamentações específicas para a educação de crianças com autismo. A legislação atualmente aborda a necessidade dos acompanhantes especializados, mas não descreve suas funções de maneira detalhada.
Flávia Marçal aponta que conceitos como atendente pessoal e profissional de apoio escolar ainda não estão devidamente regulamentados. Além disso, o Parecer 50 do CNE não aborda claramente o assunto e a Lei Berenice Piana tem sido questionada por grupos que argumentam que o autismo não é uma deficiência, uma alegação que contradiz a legislação brasileira.
Conclusão
O caso de Maria Luiza, filha do goleiro Cássio, é apenas um exemplo das muitas lutas travadas todos os dias por pais de crianças com autismo para garantir a inclusão de seus filhos na educação regular. Embora a legislação brasileira enfatize o direito à educação inclusiva, a falta de regulamentações claras e específicas para o ensino de crianças com autismo na escola regular frequentemente resulta em desafios, frustrações e barreiras para essas famílias.
É essencial que as escolas, tanto públicas quanto privadas, se comprometam a criar um ambiente inclusivo e a oferecer o suporte adequado para crianças com autismo. Isso inclui a aceitação de acompanhantes especializados e a implementação de práticas pedagógicas que atendam às necessidades específicas dessas crianças. Ao mesmo tempo, é necessário que a legislação brasileira se torne mais explícita em relação às funções e responsabilidades dos acompanhantes especializados, a fim de eliminar quaisquer mal-entendidos e discordâncias.
Baseado em informações de fontes jornalísticas sobre autismo.